Feliz imperfeição
Perfeição, segundo a teologia, é o estado ou condição de quem está livre de pecados. Já num nível menos teológico, é pessoa ou coisa sem defeito. Acaba no final, sendo a mesma coisa, coisa que se refere aos anjos, à Maria Santíssima e a Deus, a suma perfeição. Exclusivamente, estas pessoas são as que se pode referir perfeição e ninguém mais.
E o que se pode fazer, quando, encarnado em si, tem algo dizendo que já se foi perfeito? O que fazer, quando se tem uma sede e desejo de ser Deus, algumas vezes inclinadas para o desejo de perfeição? O que dizer, quando Jesus disse: “Sede santos, assim como vosso Pai celeste é santo". (Mt 5, 48) – Esse sentido de santidade, em um primeiro modo, remete à perfeição, não é? Então, o que fazer se não se pode alcançá-la em tão alto grau?
Dependendo do ponto de vista, pode ser um peso ou um alívio, a ausência de perfeição. Um peso quando se quer porque se quer ser perfeito e não se consegue, porque se quer porque se quer cumprir com as promessas feitas e não se consegue, porque se quer porque se quer não pecar e não se consegue. Não há como ter esta mentalidade e não viver com um tronco no lugar de uma cruz a se carregar, cruz esta que deveria ser um pedaço de madeiro, o que já é bastante pesado, inclusive na simbologia da coisa. Mas, que se dirá de um tronco? É cruz plus.
Por outro lado, pode ser um alívio, e que alívio pode ser não ser perfeito. Imagine saber que muitos dos erros são sem querer, que por mais que se possa tentar acertar, não se consegue. Imagine, saber que não se errou por mal, que se soubesse o certo, certamente o faria, que se fosse mais livre e tivesse menos inclinações não teria errado tanto. Imagine só não ser como Lúcifer e não carregar pela eternidade a consequência de um pecado, mas, ao contrário, admitir o próprio perdão, porque, simplesmente, não se é perfeito. Imagine não só perdoar, como também merecer o perdão de todos que tiverem a disposição de fazê-lo! Imagine! Imagine, ainda mais, deixar Jesus ajudar a cada um a carregar a própria cruz naquela que já foi carregada por Ele e por toda a humanidade de todos os tempos e eras. Ah, isso é um tremendo de um alívio.
Que caminho de perfeição se trilha ou se deve trilhar? O de reconhecer que isso não é um peso e que Deus em si será perfeito, enquanto cada um, por si mesmo, não é nada mais do que um verme miserável. Quem caminha um caminho de se aperfeiçoar, caminha um caminho sem Deus e não sabe – deveria ser budista. O cristão, na verdade, é aperfeiçoado, é moldado pelo amor de Deus, amor este que se manifesta nas mais diversas formas, inclusive nos dons e frutos do Espírito Santo que transformam tudo aquilo que por nós eram vícios em maravilhosas virtudes.
É tudo, portanto, uma questão de configuração – “Importa que ele cresça e que eu diminua.” (Jo 3, 30); “Eu vivo, mas já não sou eu; é Cristo que vive em mim.” (Gal. 2, 20ª) – e não uma questão de autodestruição e de esforço sobrenatural e de autocomiseração e de autoflagelação e de autodesistência. Não. O que Jesus diz é o diametralmente oposto: “Misericórdia eu quero, não sacrifícios. De fato, não é a justos que vim chamar, mas a pecadores".(Mt 9,13)
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