Direito de ser autoridade
Porque todas as pessoas deveriam estudar Direito? Para que aprendessem, logo no comecinho do curso, que uma liberdade termina quando outra começa, que o meu direito termina quando começa o do outro. Que existem direitos oponíveis erga omnes, isto é, direitos aos quais todas as outras pessoas devem respeitar. Mas, antes de qualquer outra pessoa, e justamente em razão da função em que esta pessoa ocupa, toda autoridade deveria ter, no mínimo, alguma noção filosófica do que é direito.
No ordenamento jurídico brasileiro existe um princípio, conhecido mais como superprincípio, pelo seu conteúdo, além da razão de ser princípio fundamental, que se encontra na alínea 3, logo do artigo primeiro, que é o da dignidade da pessoa humana. Um cristão só sabe da noção de dignidade da pessoa humana se ler o Catecismo da Igreja ou for estudante de Filosofia, e, claro, por obrigação, de Direito.
O substrato cristão desse princípio é que todos nós, seres humanos, somos filhos de Deus, criados à sua imagem e semelhança e temos, por isso, uma dignidade de valor incalculável a ser respeitada. O substrato secular, kantiano, desse princípio, é que todos nós, homens, seres racionais, temos uma dignidade única e que, independente de cor, sexo, e qualquer outro critério que se possa distinguir uma pessoa da outra, resumindo, não pode ser tratado como objeto nunca, mas, ao contrário, como um fim em si mesmo.
Um juiz de Direito, hoje, no Brasil, é obrigado, por força de lei, a ser muito mais cristão do que alguns que vemos por aí, inclusive sendo autoridades, em razão de o princípio da dignidade da pessoa humana ser orientador de todo o ordenamento jurídico brasileiro, ou seja, toda lei deve se basear na dignidade da pessoa humana, e toda sentença, lei individual, deve se basear na dignidade da pessoa humana.
Entretanto, uma autoridade, em virtude de ser autoridade e ter daí uma infalibilidade que o Papa só tem quando diz ex cathedra, não se preocupa nem com a dignidade da pessoa humana da Igreja, pelo qual ela deve respeito a qualquer ser humano, em primeiro lugar, como filho de Deus, possuindo assim um valor incomensurável, quanto menos com a dignidade secular, pela qual ela deve ver a todo ser humano como um fim em si mesmo, mas, não, ao contrário, faz dos seus sujeitos o meio de alcançar seus fins e se baseia na célebre frase, “quem obedece nunca erra”, de São João da Cruz.
Além do mais, parecem não saber, algumas autoridades, que independente de sua possível infalibilidade segundo a qual Deus, por ser misericordioso, não vai permitir com que a sua ovelha burra e obediente seja infeliz ou ande por caminho tortuoso por conta dela não é verdade e, sim, ela tem a vida de pessoas em suas mãos. Escorando-se na frase, que, quem sabe mesmo se está certa, já que um santo não é O Santo, manda e desmanda na vida de outras pessoas, sem respeitar a sua liberdade pessoal, ao menos que essa pessoa seja um rebelde e respeite a própria liberdade.
Para estas autoridades é que se deve esse texto: para que elas tenham noção de alguns parágrafos do que é direito, do que é o valor de um ser humano, e que, pelo menos em virtude deste texto, gaste uns minutos da sua vida com uma reflexão acerca de seus próprios atos.
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