Narcisei

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narciso“Minha paróquia é melhor, minha comunidade é melhor, meu ejc é melhor, meu grupo de oração é melhor”. Esse é o pensamento que está por trás de toda crítica que se faz a algo que não é o nosso, que não é o que nós pensamos ou que não é o que nós gostamos. É o orgulho que, em menor proporção, leva a desentendimentos e numa maior, a completa cegueira da realidade, voltando o narciso para si mesmo, onde é a medida de todas as coisas.

Só que esse narciso, em vez de morrer, mata. Por um simples gosto pessoal em não gostar de rock, o orgulho emite uma opinião diferente, porque narciso não pode aceitar somente o seu gosto, mas tem de ser o centro, e diz que rock não é de Deus e aquela banda não pode ser também. Narciso sai espalhando sua opinião e causando divisão, em vez de aceitar que aquelas pessoas procuram evangelizar e devolvem o melhor que tem a Deus. O orgulho de narciso não deixa enxergar o dom que os outros são.

Narciso também quer voltar no tempo, quando a Igreja era como ele gosta que seja Igreja, e não aceita as novidades, quanto menos se adequa a elas. Narciso, em prol do próprio gosto, volta-se contra o próprio papa, se ele age de maneira que não é a que narciso gosta. Narciso, quanto a isso, acha que é conservador, mas não passa de um conservador de si mesmo no centro do jardim do éden.

Narciso cresce como pedra. Inchando-se, e alheio completamente à realidade, absorto daquele orgulho que cega, do qual são domingos falava, considera-se, e usa de qualquer desculpa para isto, infalível. É aquele que chegou ao nível da união hipostática, no ápice do amor esponsal, que já recebeu os estigmas, mesmo que imaginários, e não admite de si nenhum erro, porquanto todos os seus atos são reflexo da sua união íntima e inseparável de Deus. Narciso aí chega num nível tão alto de cegueira, que pode falar sobre narcisismo e não se identificar.

Narciso, infeliz, guarda a si mesmo e a própria vida como um tesouro que ninguém pode tocar, nem Deus. Com sua inteligência insuperável, identifica o erro em tudo e em todos, e mesmo que não consiga superar o que vê em si mesmo, exige que os outros se portem de acordo com aquilo que ele não consegue viver. Narciso não aceita ser contrariado. Nem por Deus, que é o seu supremo bem e quem melhor governa sua vida, com uma inteligência infinitamente superior a de narciso. Narciso, mesmo assim, não o reconhece.

Narciso é também aquele que não aceita a própria limitação intelectual e toma a si mesmo como alguém que pode opinar em algo, mesmo que aquela opinião seja fundamentada em nada mais nada menos do que nada e tenha acabado de surgir no oco do seu saber. Como narciso vê a si mesmo com os olhos de alguém que não se aceita e cria uma imagem que ele quer enxergar, vê sempre uma mentira em si mesmo que os outros não veem, não identifica a sua imagem verdadeira e demoniza os demais.

Narciso está aí em todo lugar, em toda cabeça e em toda alma, só que não se enxerga. Narciso é o causador, desde revoluções e divisões na igreja, a separações entre pessoas que tem o mesmo propósito. Narciso vê tudo em todos, tem todas as soluções para todos os problemas, menos para si mesmo, porque por ser narciso, ele, infelizmente, não os identifica, não os vê. Não os reconhece. Não se reconhece.

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Direito de ser autoridade

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Adolf-Hitler-9340144-2-402Porque todas as pessoas deveriam estudar Direito? Para que aprendessem, logo no comecinho do curso, que uma liberdade termina quando outra começa, que o meu direito termina quando começa o do outro. Que existem direitos oponíveis erga omnes, isto é, direitos aos quais todas as outras pessoas devem respeitar. Mas, antes de qualquer outra pessoa, e justamente em razão da função em que esta pessoa ocupa, toda autoridade deveria ter, no mínimo, alguma noção filosófica do que é direito.

No ordenamento jurídico brasileiro existe um princípio, conhecido mais como superprincípio, pelo seu conteúdo, além da razão de ser princípio fundamental, que se encontra na alínea 3, logo do artigo primeiro, que é o da dignidade da pessoa humana. Um cristão só sabe da noção de dignidade da pessoa humana se ler o Catecismo da Igreja ou for estudante de Filosofia, e, claro, por obrigação, de Direito.

O substrato cristão desse princípio é que todos nós, seres humanos, somos filhos de Deus, criados à sua imagem e semelhança e temos, por isso, uma dignidade de valor incalculável a ser respeitada. O substrato secular, kantiano, desse princípio, é que todos nós, homens, seres racionais, temos uma dignidade única e que, independente de cor, sexo, e qualquer outro critério que se possa distinguir uma pessoa da outra, resumindo, não pode ser tratado como objeto nunca, mas, ao contrário, como um fim em si mesmo.

Um juiz de Direito, hoje, no Brasil, é obrigado, por força de lei, a ser muito mais cristão do que alguns que vemos por aí, inclusive sendo autoridades, em razão de o princípio da dignidade da pessoa humana ser orientador de todo o ordenamento jurídico brasileiro, ou seja, toda lei deve se basear na dignidade da pessoa humana, e toda sentença, lei individual, deve se basear na dignidade da pessoa humana.

Entretanto, uma autoridade, em virtude de ser autoridade e ter daí uma infalibilidade que o Papa só tem quando diz ex cathedra, não se preocupa nem com a dignidade da pessoa humana da Igreja, pelo qual ela deve respeito a qualquer ser humano, em primeiro lugar, como filho de Deus, possuindo assim um valor incomensurável, quanto menos com a dignidade secular, pela qual ela deve ver a todo ser humano como um fim em si mesmo, mas, não, ao contrário, faz dos seus sujeitos o meio de alcançar seus fins e se baseia na célebre frase, “quem obedece nunca erra”, de São João da Cruz.

Além do mais, parecem não saber, algumas autoridades, que independente de sua possível infalibilidade segundo a qual Deus, por ser misericordioso, não vai permitir com que a sua ovelha burra e obediente seja infeliz ou ande por caminho tortuoso por conta dela não é verdade e, sim, ela tem a vida de pessoas em suas mãos. Escorando-se na frase, que, quem sabe mesmo se está certa, já que um santo não é O Santo, manda e desmanda na vida de outras pessoas, sem respeitar a sua liberdade pessoal, ao menos que essa pessoa seja um rebelde e respeite a própria liberdade.

Para estas autoridades é que se deve esse texto: para que elas tenham noção de alguns parágrafos do que é direito, do que é o valor de um ser humano, e que, pelo menos em virtude deste texto, gaste uns minutos da sua vida com uma reflexão acerca de seus próprios atos.

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